Como ajudar alguém que sofre emocionalmente? De que forma é possível conviver com as pressões por desempenho que estão no centro da experiência universitária, sem que a saúde seja afetada? Essas e outras questões foram levantadas durante o I Seminário de Saúde Mental promovido pelo Centro de Atenção à Saúde 4 (Casa 4) em Curitiba nesta quarta-feira (27), no campus de Ciências Agrárias. Cerca de 100 participantes foram reunidos, entre servidores, professores, alunos e comunidade. As inscrições ficaram esgotadas em poucas semanas.
A programação contou com duas mesas redondas, além de palestras e bate-papo com a plateia. O seminário foi incluído na programação do Setembro Amarelo, a campanha de prevenção contra o suicídio criada pelo Centro de Valorização da Vida (CVV). De acordo com o coordenador da Casa 4, Luiz Arilton Vieira, a ideia é que, como a experiência foi positiva, o seminário seja realizado anualmente.
Em uma das mesas redondas, ao abordar o estresse que acomete tanto estudantes quanto trabalhadores, a psiquiatra Carmen Lúcia Schettini, que atua na Casa 4, defendeu que os ambientes mais competitivos têm contribuído para o aumento do assédio e, por consequência, das crises de esgotamento (burnout).
Isso não significa, porém, que esses temas sejam novidade, no entender da médica. “Sempre existiu. A diferença é que não davam-se nomes. Era chamado de ‘brincadeira’, de ‘chacota’. A postura do chefe era de que tinha de dominar e as pessoas eram submissas”, conta ela, lembrando que a submissão era considerada uma virtude profissional.
A médica relata que o cenário passou a ser visto com mais nitidez assim que as leis e a mídia adotaram um discurso mais favorável à saúde mental. Atualmente, no entender de Carmen, a passividade acaba por ser um aspecto comportamental que pode piorar o sofrimento emocional de quem sofre com o assédio.
Estudantes
Na mesma discussão, a psicóloga Lúcia Maria de Oliveira Santos, da Casa 4, trouxe dados de um estudo do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (Fonaprace), divulgado em 2011, que revela dados socioeconômicos de 19,6 mil universitários brasileiros, entre os quais 412 alunos da UFPR. Na época em que foi realizado o estudo, quase metade dos 19,6 mil estudantes (47,7%) relatou ter vivenciado crise emocional nos últimos 12 meses.
As dificuldades que mais afetavam o desempenho dos estudantes, na visão deles, eram ansiedade (70%), distúrbios de sono (44%), sensação de desamparo ou desesperança (36%), confusão mental (31%), timidez excessiva (25%), depressão (22%), medo ou pânico (14%) e problemas alimentares (12%).
Lúcia lembrou que tanto o ingresso na universidade quanto a iminência da formatura trazem expectativas que geram fragilidade emocional. “O ingresso é permeado de expectativas, é construído através de um sonho. Quem não quer se formar em uma universidade? Mas quando o aluno entra, percebe um ambiente diferente do que imaginou e isso pode causar frustração”, avalia. O ingresso, em geral, coincide com a entrada na vida adulta e carrega consigo a necessidade de uma nova rede de relacionamento, de lidar com questões financeiras e de desenvolver estratégias de estudo e de organização antes não necessárias.
Já o graduando precisa conciliar o estágio, que cobra dele colocar o que aprendeu em prática, além de lidar com dúvidas sobre a inserção no mercado de trabalho e sobre o futuro.
Sendo assim, Lúcia citou que a universidade exige do aluno recursos internos (como habilidade sociais, de organização, de administração de tempo e capacidade de lidar com rejeição) e externos (rede de amigos, recursos financeiros, apoio familiar, vínculos que o ajudem no mercado de trabalho, aprimoramento do currículo com atividades extracurriculares). Nem todo mundo tem recursos emocionais para tanto, lembra a psicóloga.
“Para isso, é preciso desenvolver habilidades que criem um senso de autoeficácia, de que se pode dar conta e ter sucesso”, diz ela. Uma saída é desenvolver o autoconhecimento — conhecer suas aptidões e fragilidades — e usar a observação para entender o ambiente e as pessoas. Mais do que tudo, a psicóloga avisa que se evitem comparações, pois elas não ajudam em nada. “Olhe para si mesmo. É preciso que a pessoa saiba que passo pode dar”.
Professora do Departamento de Psicologia da UFPR, Elaine Cristina Schmitt Ragnini ressaltou, porém, que, apesar de a visão individual de mundo influenciar a forma como as pessoas reagem aos acontecimentos, nem sempre o “discurso da resiliência” é justo. “Nem tudo depende da gente”, pondera. “Às vezes é a organização social que não vai bem e, mesmo constituídas, elas podem e devem ser revistas”.
Suicídio
Durante a mesa redonda em que foi abordado o suicídio, a psicóloga Sandra Fergutz Batista enumerou os diversos fatores de risco para o problema, segundo relatório recente da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Esses fatores se dividem em transtornos mentais (depressão, alcoolismo e esquizofrenia); questões sociodemográficas, tais como isolamento social, a vida em cidades pequenas e em ambientes rurais; aspectos psicológicos, como perdas recentes, sentimento de desesperança, estigmas e preconceitos vivenciados e baixa resiliência pessoal; e condições clínicas (lesões desfigurantes, dores crônicas, doenças degenerativas e câncer).
Sandra enfatizou, contudo, o peso que preconceitos sociais têm no crescimento desse problema de saúde pública. A situação já figurou no boletim epidemiológico “Suicídio: Saber, Agir e Prevenir”, do Ministério da Saúde.
Segundo o relatório, entre as populações mais vulneráveis estão idosos, pessoas em condição de rua, presidiários, pequenos agricultores, gays e bissexuais e indígenas. Membros desses grupos têm de duas a sete vezes mais propensão a cometer suicídio do que a média. Com base nisso, a psicóloga defendeu que a prevenção contra o suicídio deve estar vinculada ao enfrentamento da discriminação e do preconceito, além de buscar reduzir o tabu relacionado ao tema.
“O estigma [sobre o suicídio] impede a procura por ajuda, que poderia evitar muitas mortes”, disse. Mudanças nesse sentido teriam de se refletir no acolhimento de sobreviventes de tentativas de suicídio ou em casos de lesões autoprovocadas, que continuam o principal fator de risco para o suicídio. “Essas situações expressam uma crise e tendem a escalar. Por isso, é preciso saber como intervir de forma precoce e adequada, e não só em relação à pessoa, mas sobre o conjunto de relações dela [familiares e amigos]”.
Jovens
A psiquiatra Sabrina Stefanello, que é professora do Departamento de Psiquiatria da UFPR, percebe que jovens precisam de atenção sobre o tema. Ela lembra que o número de suicídios entre adolescentes e jovens adultos tem crescido, especialmente em países subdesenvolvidos. A professora faz parte da “Comissão para Formação de Rede de Saúde Mental na UFPR”, criada neste ano para discutir o atendimento na universidade.
Sabrina também compreende que aspectos relacionados a essa fase da vida, como a necessidade de se sentir pertencente a um grupo, estão sendo desafiados pela sociedade de informação. “A conetividade aumentou, mas os laços sociais diminuíram”, avaliou. “O ‘eu posso tudo’ que a tecnologia dá a entender não se verifica na vida real. Isso pode afastar em vez de unir”.
No âmbito da universidade, a psiquiatra sustenta que a prevenção deve ser abrangente. “Precisamos pensar a universidade como um todo, promover o bem-estar, acolher e garantir cuidado”, disse. “Devemos nos questionar: o que funciona de fato? Porque já se gastou muito dinheiro com campanhas amplas, generalistas, que mostraram não ter muito retorno. Identificar e cuidar das pessoas que estão vulneráveis parece ter melhor custo benefício”.
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