

Um dos maiores entraves para avanços na pesquisa científica e tecnológica brasileira está hoje na área administrativa, segundo grande parte de pesquisadores amparados pelo financiamento público. Apesar das dificuldades encontradas em todas as etapas, é no momento de utilizar os recursos garantidos que muitas pesquisas estacionam. Problemas para a importação de equipamentos e insumos fundamentais aos trabalhos têm sido levantados por instituições de todo o país e foi o assunto discutido em evento na Universidade Federal do Paraná (UFPR), nesta quinta-feira (31), com a participação de 23 universidades brasileiras e dos principais órgãos públicos relacionados aos processos.
A iniciativa para a realização do 2° Seminário sobre Importação para Pesquisa Científica e Tecnológica partiu da UFPR, por meio da Divisão de Importação, em parceria com a Escola de Administração Fazendária do Paraná (ESAF/PR). O evento encerrou o segundo curso promovido pelas duas instituições e oferecido a universidades federais de 13 estados brasileiros. O objetivo foi promover capacitação e maior esclarecimento sobre a legislação e os procedimentos que envolvem a importação direcionada a pesquisas científicas e tecnológicas.
“A UFPR é pioneira e hoje referência nos processos de importação para a pesquisa. Vemos as mesmas dificuldades por todo o país e por isso buscamos, por esse evento, reunir em um mesmo local pesquisadores e órgãos relacionados a todas as etapas desse tipo de aquisição. Nossa ideia é que essas pessoas e entidades saiam daqui com uma maior compreensão tanto sobre leis e processos quanto sobre dificuldades enfrentadas e expectativas de quem faz pesquisa no Brasil”, explica a diretora de Importação da UFPR e uma das organizadoras do evento, Alba de Araújo.


Para a diretora-geral adjunta da ESAF/PR, Rai de Almeida, a parceria da Instituição com o ambiente acadêmico é necessária “para se protagonizar a facilitação das informações”. “É importante o encontro para discutirmos juntos problemas do cotidiano e ter acesso a possíveis soluções. Mas é consenso que há uma grande lacuna de interpretação e até de formulação da legislação sobre o tema. A reunião de todos os entes envolvidos pode significar grandes avanços para a busca de novos caminhos, articulação de outros atores ou mesmo maior pressão para o aprofundamento das discussões e aprimoramento dos processos”, afirma a diretora.
Contexto
De acordo com a Receita Federal, órgão também presente no Seminário, somente o Paraná, de 2012 a junho de 2013, movimentou mais de 42 milhões de dólares na importação de equipamentos e insumos voltados à pesquisa. No entanto, o tempo de espera para a chegada dos produtos pode levar meses e até anos, fazendo com que muitos paralisem suas pesquisas ou mesmo mudem os trabalhos de rumo. Levantamento realizado pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ICB-UFRJ), durante o último ano, mostrou que 99% dos cientistas brasileiros dependem de produtos importados para suas pesquisas.
Segundo a inspetora-chefe da Inspetoria da Receita Federal em Curitiba, Claudia Regina Thomaz, a complexidade da legislação e o desconhecimento sobre os procedimentos podem atrasar e, assim, prejudicar o andamento das pesquisas. “Eventos como esse ajudam a nos aproximar dos pesquisadores e evitar futuros contratempos. Além disso, estamos buscando aperfeiçoar nossos sistemas, com maior interatividade e transparência”, diz Claudia Regina.


O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) também participou das discussões e, por meio de sua coordenadora de Credenciamento à Importação e Incentivo Fiscal, Nívia Wanzeller, reforçou a abertura do órgão a questionamentos e dificuldades encontradas pelos pesquisadores. Ela concorda que o desconhecimento, pelos importadores, dos procedimentos e documentos necessários seja uma das principais causas para os atrasos significativos na liberação de cargas. “Precisamos saber o que está acontecendo para que possamos proceder da melhor maneira enquanto gestores dessa legislação. A UFPR é exceção entre as universidades pelo privilégio de possuir um setor específico para a área de importação, consolidado e atuante. Mas as demais precisam ter no CNPq seu canal de comunicação para o relato de suas dificuldades”, avalia a coordenadora.
Caminhos
Em sua fala aos participantes, o presidente da agência de fomento Fundação Araucária, Paulo Roberto Brofman, considerou que o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil tem, de fato, esbarrado em diversos obstáculos administrativos. No entanto, Paulo Roberto lembra que um dos caminhos para muitas soluções pode estar em dispositivos legais – alguns em tramitação, outros já aprovados – provenientes de desdobramentos do projeto de lei 2177/2011, intitulado Código de Ciência e Tecnologia.”Sabemos que a semente da sustentabilidade é o investimento em ciência, tecnologia e inovação. A aprovação dessas novas ferramentas legais certamente trará maior flexibilidade para facilitação das pesquisas e, assim, da sustentabilidade e da evolução”, acredita.
“Quanto menos tempo perdermos em questões burocráticas, mais ganhamos em avanços de nossa performance, potencial econômico e, acima de tudo, desenvolvimento humano”, ponderou o vice-reitor da UFPR, Rogério Mulinari, em participação no Seminário. Além das preocupações levantadas com relação ao retrabalho e à economicidade, ao mencionar a sociedade, o vice-reitor salientou um dos grandes papéis dos pesquisadores. “Não podemos nos esquecer que a ciência, a tecnologia e a inovação são fomentadas para a agregação de valores e por recursos que vêm de nossos concidadãos. Pessoas que, em maioria, estão fora das universidades e muito distante dos círculos da ciência”, alerta o vice-reitor, lembrando a pessoas e instituições envolvidas no campo das pesquisas o peso da responsabilidade social na utilização do recurso público.
Também estiveram presentes nas discussões representantes do Tribunal de Contas da União (TCU), Advocacia Geral da União (AGU), Ministério Público da União (MPU), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa – MS) e Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), por meio de diretores das pastas do Siscoserv e Siscomex.
Por Jaqueline Carrara